Simplificadamente, a Sociolinguística trata da relação entre língua e sociedade, ou seja, estuda a linguagem em uso no contexto social, nos mais diversos enfoques.
A Sociolingística interacional estuda as circunstâncias do processo de comunicação, ligando-se a análise da conversação que cada participante sustenta na interação verbal em curso. Já a Sociolinguística variacionista examina a linguagem no contexto social recorrendo às variações e aos problemas que emergem no sistema lingüístico. Assim, nas diferentes situações comunicativas, uma mesma língua sofre variedades semânticas, fonológicas, etc, comprovando que os falantes raramente se expressam da mesma maneira em diferentes circunstâncias de comunicação. Tais variedades apresentam-se cotidianamente, em concordâncias nominais e/ou verbais como: “Os menino”, “a gente vamos”; fonológicas: vãmu (vamos), cumê (comer), rumbora (vamos embora); ou semântica: ata/fruta do conde, abóbora/ jerimum.
Na realidade, a diversidade é uma propriedade funcional e inerente aos sistemas linguísticos e o papel da Sociolinguística é exatamente enfocá-la como objeto de estudo, em suas determinações lingüísticas e não-linguísticas, comprovando a dinamicidade das línguas naturais humanas.
A linguagem é, sem dúvida alguma, a expressão mais característica de um comportamento social, sendo, por isso, impossível separá-la de suas funções sócio-interacionistas.
Todo linguista concorda com o princípio de que nenhuma língua natural humana é um sistema em si mesmo homogêneo e invariável. Em todos os níveis de análise, depara-se com o fenômeno da variação.
A língua comporta variantes em função da identidade social do emissor, identidade social do receptor e condições sociais de produção discursiva, sendo essas subdivididas em variantes geográficas, socioculturais, de registro ou estilísticas.
O domínio de uma língua deriva do grau de contato entre os falantes da comunidade e, quanto maior o intercâmbio entre os falantes de uma língua, tanto maior a semelhança entre seus atos verbais. Dessa tendência entre os atos verbais dos membros de uma mesma comunidade é que vai surgir a variação geográfica, considerando ainda os aspectos culturais, políticos e econômicos. Esse tipo de variação linguística é restrito, identificando os membros de uma comunidade ou os distinguindo dos membros de outras. Para percebermos melhor essas diferenças geográficas, basta observarmos os falares dos nordestinos em relação à região sudeste.
Agora, considerando o grau de intercâmbio social que os falantes mantêm entre si, a variação sociocultural surge dos atos verbais entre os indivíduos pertencentes a um mesmo setor socioeconômico e cultural, considerando aspectos de renda familiar, grau de escolaridade, idade/ sexo, ocupação profissional, entre outros, sejam fatores isolados ou combinados entre si. É fácil observar a diferença entre uma pessoa escolarizada e uma não alfabetizada, bem como a linguagem dos idosos comparada a dos jovens.
Fatores como idade, sexo e ocupação motivam a distinção entre a linguagem comum e as linguagens especiais. Aquela corresponde o inventário léxico e sintático referente aos conceitos comuns a todos os membros de uma comunidade linguística relativamente homogênea, enquanto esta consiste em variedades dialetais próprias das diversas subcomunidades lingüísticas, cujos membros compartilham uma forma especial de atividade, sobretudo profissional, mas também científica e lúdica. Os termos científicos bem como as gírias são exemplos de subcategorias das linguagens técnicas ou especiais.
A diversidade linguística não está restrita a determinações motivadas por origem sociocultural e geográfica. Um mesmo indivíduo pode alternar entre diferentes formas lingüísticas de acordo com a variação das circunstâncias que cercam a interação verbal, incluindo-se no contexto social, propriamente dito, o assunto tratado, a identidade social do interlocutor etc. Por exemplo, um professor universitário, num restaurante com amigos e/ou alunos, vai se utilizar de uma linguagem meramente informal, enquanto na sala de aula ou numa palestra não ficaria bem o emprego de formas não-padrão (cê, tá, bora).
A variação estilística ou de registro é o resultado da adequação da expressão às finalidades específicas do processo de interação verbal com base no grau de reflexão do falante sobre as formas que seleciona para compor seu enunciado. Sendo assim, é possível considerar dois limites extremos na transição entre os diferentes estilos possíveis: o estilo informal, em que é mínimo o grau de reflexão sobre as formas empregadas no discurso e o estilo formal, em que é máximo o grau de reflexão que se projeta sobre as formas linguísticas.
A alternativa teórica introduzida por Labov, na década de 1960, para resolver problemas da estrutura linguística, além de, por princípio, postular que a heterogeneidade é inerente ao sistema lingüístico, concebe sua análise a partir de um conjunto de formas que se manifestam, de fato, no contexto social. Nessa perspectiva, a língua é constituída por um conjunto de fenômenos não estritamente linguísticos, mas também extralingüísticos, que participam ativamente da aplicação de uma regra, favorecendo-a ou desfavorecendo-a. É possível afirmar que se inaugurou aí, com o advento da Sociolinguística, um dos primeiros movimentos orquestrados, não obviamente o único, contra a tendência tradicional de considerar a língua um objeto de estudos tão isolado do uso que lhe dá a configuração de um cadáver, de uma língua morta.
Partindo do contexto de que a linguagem varia e que natureza é variação, resta-nos avaliarmos as conseqüências que essas linguagens trazem para o ensino da língua materna. Tais variações podem contribuir para a natureza discriminatória, visto que um falante que utiliza as variantes de prestígio prevalecerá sobre aquele que não a usa; teremos uma discriminação social pela linguagem.
Tal cultura contradiz o objeto de estudo da Sociolinguística que considera as variedades e o processo de comunicação. Esse estigma é pregado pela escola que insiste em classificar a linguagem como “certa” ou “errada”. A instituição escolar procura liquidar as formas da variedade não-padrão, suprindo a lacuna com alternativas próprias da norma culta. No entanto, a riqueza maior da língua provém do falar, dos atos de comunicação. Para isso, a escola precisa acreditar no modelo da diferença e adotar outra estratégia para o ensino da língua materna. Afinal, o aluno precisa aprender a conviver em diferentes situações comunicativas, aplicando adequadamente a linguagem de acordo com o contexto social. Afinal, o ensino da variedade padrão não necessita ser substitutivo e, por isso, não implica a erradicação dos diversos dialetos. Cabe ao professor o bom senso para fornecer ao aluno as chaves para perceber as diferenças de valor social entre as variações linguísticas e, depois, saber tirar vantagem dessa habilidade, selecionando a mais adequada conforme as exigências das circunstâncias do intercurso verbal.
Finalmente, cabe-nos reconhecer a contribuição da Sociolinguística para o entendimento da língua, compreendendo que as circunstâncias sociais motivam suas variações e processos de comunicação. Não devemos ignorar essas variantes, nem tampouco incorrermos no erro de classificar essas linguagens em “certas” ou “erradas”, visto que são faladas por todos, nas diversas situações comunicativas.
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